segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

CONCEITO, ESCOPO E PRINCÍPIOS DO INSTITUTO DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE ASSENTAMENTOS URBANOS PREVISTA NA LEI Nº 11.977/2009


Continuando a dinâmica que propus na minha última exposição, trago hoje a primeira parte do meu trabalho de conclusão da pós-graduação em Direito Notarial e Registral.
 

1 CONCEITO, ESCOPO E PRINCÍPIOS DO INSTITUTO DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE ASSENTAMENTOS URBANOS PREVISTA NA LEI Nº 11.977/2009
 
Convém fazer uma breve explanação sobre a regularização fundiária de assentamentos urbanos prevista na Lei nº 11.977/2009, a fim de possibilitar um claro entendimento dos demais tópicos do presente trabalho.

O conceito e escopo nos são dado pelo art. 46 da Lei nº 11.977/2009:

A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. 

Na segunda parte do supracitado artigo é possível perceber que a lei contempla uma positivação de valores e direitos de cunho constitucional, senão vejamos: direito social à moradia (art. 6º da Constituição Federal), função social da propriedade (art. 5º, XXIII, da Constituição Federal), direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, caput, da Constituição Federal).

O fato de possuir a realização de escopos explicitamente constitucionais é determinante para que a aplicação da lei procure sempre o máximo possível de concretização.

Realmente, sendo a constituição a base normativa do ordenamento, todo o ordenamento jurídico existe com o intuito primeiro de realizar os valores e princípios constitucionais. Porém, isso não impede que possamos identificar algumas leis que são mais que reflexo, são mesmo instrumento.

A partir do conceito do instituto já fica muito claro para nós que não é possível opor princípios de um ramo do direito, como o registral, a uma lei que nasce com a nobre missão de propiciar a realização de direitos de grandeza constitucional. Ora, quando consideramos que a regularização fundiária é instrumento para a realização dos princípios constitucionais, não há como sustentar que os princípios de um dos ramos do direito lhe oponham resistência à sua plena aplicação.

Há regularização fundiária de duas espécies, conforme art. 47, VII e VIII, da Lei nº 11.977/2009:

Ø regularização fundiária de interesse social; e

Ø regularização fundiária de interesse específico.

A regularização fundiária de interesse social, nos termos do inciso VII, alíneas a, b e c do art. 47 da Lei nº 11.977/2009, deve recair sobre:

“assentamentos irregulares ocupados, predominantemente, por população de baixa renda, nos casos: em que a área esteja ocupada, de forma mansa e pacífica, há, pelo menos, 5 (cinco) anos; de imóveis situados em ZEIS; ou de áreas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social”.
 
A própria Lei nº 11.977/2009 esclarece no inciso V do art. 47 que ZEIS (Zona Especial de Interesse Social) trata-se de “parcela de área urbana instituída pelo Plano Diretor ou definida por outra lei municipal, destinada predominantemente à moradia de população de baixa renda e sujeita a regras específicas de parcelamento, uso e ocupação do solo”.

Regularização fundiária de interesse específico é aquela na qual não se configura, legalmente, como sendo de interesse social, assim dispõe o inciso VIII do art. 47 da Lei nº 11.977/2009.

São princípios da regularização fundiária, nos termos do art. 48 da Lei nº 11.977/2009:

I – ampliação do acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda, com prioridade para sua permanência na área ocupada, assegurados o nível adequado de habitabilidade e a melhoria das condições de sustentabilidade urbanística, social e ambiental;

II – articulação com as políticas setoriais de habitação, de meio ambiente, de saneamento básico e de mobilidade urbana, nos diferentes níveis de governo e com as iniciativas públicas e privadas, voltadas à integração social e à geração de emprego e renda;

III – participação dos interessados em todas as etapas do processo de regularização;

IV – estímulo à resolução extrajudicial de conflitos; e
 
V – concessão do título preferencialmente para a mulher.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

UMA LEITURA DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE ASSENTAMENTOS URBANOS À LUZ DO DIREITO REGISTRAL. INTRODUÇÃO.


Com alegria informo que concluí minha especialização em Direito Notarial e Registral na Universidade Anhaguera, isso explica meu sumiço temporário neste blog.

Gostaria de participar aos caros leitores que o tema de minha monografia foi: “UMA LEITURA DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE ASSENTAMENTOS URBANOS À LUZ DO DIREITO REGISTRAL.”

Trazer o conteúdo da monografia de uma só vez tornaria muito cansativa a leitura. Então, resolvi apresentar-lhes em etapas.

Hoje, segue a introdução:

INTRODUÇÃO

Todo o trabalho desenvolve-se em um contexto em que o direito à moradia passa a deter, na ordem constitucional da República Federativa do Brasil, a nomenclatura de direito social, passando a possuir tal “status” constitucional a partir da Emenda Constitucional nº 64 de 2010. Entendemos ser este um marco histórico-jurídico de importância suprema na interpretação das leis que de alguma forma normatizam o direito à moradia, capaz inclusive de impelir que os precedentes judiciais avancem no sentido de cada vez mais realizar concretamente esse direito.

A conjuntura político-social do Brasil leva-nos a uma irreversível cultura de inclusão social, neste sentido o Governo Federal, na intenção de “assegurar o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, nos termos da previsão do art. 46 da Lei nº 11.977/2009, passa a aprimorar meios jurídicos de regularização fundiária de assentamentos urbanos. O aprimoramento foi tamanho que causou impacto até na Lei de Registro Público, que precisou adequar-se, criando com a Lei nº 12.424/2011 um capítulo próprio para tratar do assunto, qual seja, capítulo XII do título V (arts. 288-A a 288-G da Lei nº 6.015/1973).

No presente trabalho ousamos desenvolver uma dialética entre os princípios registrais e a teleologia que move a normatização da regularização fundiária de assentamentos urbanos.

Moveu-nos a tal intento o fato de que uma leitura apressada do conteúdo normativo que envolve a regularização fundiária de assentamentos urbanos pode levar alguns a concluir que a lei derroga ou afasta alguns princípios registrais. Por isso, resolvemos que seria adequado aprofundar o tema alargando os horizontes para visualizar o ordenamento jurídico como um todo.
No desenvolvimento do tema prevaleceu uma leitura interpretativa mais voltada à ratio legis, em uma explícita tentativa de contribuir para uma aplicação dos artigos 288-A a 288-G da Lei de Registros Públicos de maneira segura, de modo que o direito social à moradia, consagrado na Constituição Federal, seja efetivado em sua plenitude.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

FUNDAMENTO PARA REQUERER CÓPIA DE DOCUMENTO ARQUIVADO EM CARTÓRIO NOS TERMOS DO CÓDIGO DE NORMAS E PROCEDIMENTOS DOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO DO ESTADO DO PIAUÍ.


É possível requerer expedição de certidão contendo cópia reprográfica autenticada de documentos arquivados na Serventia, com fulcro no art. 18 da Lei nº 6.015/72 e arts. 50, 92 e 129 do Código de Normas e Procedimentos dos Serviços Notariais e de Registro do Estado do Piauí.

  Nos termos do art. 17 da Lei nº 6.015/72, “qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido”.

Eis que o requerimento fundamenta-se na Lei dos Registros Públicos e especialmente no Código de Normas e Procedimentos dos Serviços Notariais e de Registro do Estado do Piauí, vejamos:

Lei nº 6.015/72

Art. 18. Ressalvado o disposto nos arts. 45, 57, § 7o, e 95, parágrafo único, a certidão será lavrada independentemente de despacho judicial, devendo mencionar o livro de registro ou o documento arquivado no cartório.

(grifos acrescidos)

 

Código de Normas e Procedimentos dos Serviços Notariais e de Registro do Estado do Piauí

Art. 50. A certidão será lavrada independentemente de despacho judicial, ressalvados os atos sob o sigilo judicial ou fiscal e as vedações legais, devendo mencionar o livro do assento ou o documento arquivado, bem como a data de sua expedição e o termo final do período abrangido pela pesquisa.

(grifos acrescidos)
 

Art. 92.Compete ao tabelião de notas:

V - expedir traslados, certidões negativas ou positivas, de seus atos ou documentos arquivados, cópias reprográficas e outros instrumentos autorizados por lei;

(grifos acrescidos)
 

Art. 129. As certidões serão expedidas a vista do que constar dos livros e fichas do tabelionato. De documentos arquivados na serventia podem ser expedidas cópias reprográficas autenticadas.

Parágrafo único. Neste caso, quando o documento arquivado tratar-se de fotocópia autenticada, é permitida nova fotocópia e respectiva autenticação, devendo o tabelião atestar, no ato, esta circunstância.

(grifos acrescidos) 

Os artigos supratranscritos consagram e efetivam o princípio da publicidade.

Mesmo que não houvesse a previsão expressa do Código de Normas e Procedimentos dos Serviços Notariais e de Registro do Estado do Piauí o princípio da publicidade bastaria para fundamentar o presente pleito. Neste sentido, da suficiência do princípio da Publicidade, convém transcrevermos resposta da ANOREG-SC (Associação dos Notários e Registradores do Estado de Santa Catarina) à consulta a respeito da possibilidade do presente pleito nos Cartórios daquele Estado:


Resposta

Todo e qualquer documento arquivado na serventia é público, ficando sob a responsabilidade e guarda do titular, podendo ser fornecida cópia autenticada a  qualquer pessoa[1]. Não será fornecida cópia de documentos cujo teor deva ser mantido em sigilo devido a determinação judicial.

            Balbino Filho[2] ao tratar da publicidade dos registro públicos estabelece:

 A publicidade formal dos registros se efetiva pela expedição de certidões de seus respectivos assentos, de documentos arquivados e de informações solicitadas pelas partes.

             Cabe ressaltar que a certidão é a reprodução textual e autêntica de documento original, ou assento, extraído de livro de registro público.

            Assim, o registro e o documento que lhe deu origem são públicos, podendo ser objeto de certidão.  

            É possível também, a reprodução e autenticação de documentos objeto de registro e/ou averbação, como por exemplo, nos casos de instrumentos particulares[3]. O item 6 da Tabela II do Regimento de Custas e Emolumentos[4] estabelece o valor da autenticação de cópia de documento arquivado em cartório.

            É obrigação e dever do oficial manter em segurança, permanente, os livros e documento, devendo guardá-los em local seguro, pois são responsáveis pela sua ordem e conservação[5].

            Com o intuito de salvaguardar a segurança dos livros e documentos que compõe o arquivo da serventia, não é permitido que pessoas estranhas tenham acesso aos arquivos. Qualquer informação solicitada pela parte será atendida através de certidão ou cópia autenticada.
 




[1] Artigo 17 da  Lei 6015/73: “ Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido”.

[2] Balbino Filho, Nicolau. Direito Imobiliário Registral: São Paulo: Saraiva, 2001, p. 152.

[3] Promessa de Compra e Venda, Cessão de Direitos, Termo de Quitação, etc.

[4] Regimento de Custas e Emolumentos, Tabela II, item 6 - Autenticação de cópia de documento a
(...)

terça-feira, 24 de setembro de 2013

PROVIMENTO Nº 024 DA CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ


Aos leitores do Estado de Piauí interessa tomar conhecimento do Provimento nº 024, de 24 de setembro de 2013, que no âmbito do Tabelionato de Notas trata da outorga de procuração por idosos e da verificação de capacidade civil destes para firmar atos notariais.
Segue a íntegra do Provimento: 

PROVIMENTO Nº 024, de 24 de SETEMBRO de 2013.

Regulamenta a lavratura de atos notariais que envolvam pessoas idosas e dá outras providências.

O CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA, Excelentíssimo Senhor Desembargador Francisco Antônio Paes Landim Filho, no uso de suas atribuições legais e regimentais;

CONSIDERANDO que a Corregedoria-Geral de Justiça é órgão de orientação, controle e fiscalização dos serviços extrajudiciais, com atribuição em todo o Estado;

CONSIDERANDO a necessidade de se proceder a uma interpretação operativa, ou seja, aquela dotada de eficácia normativa apta a pôr em pratica as disposições do Estatuto do Idoso, por meio da adoção de medidas direcionadas a dar efetividade ao microssistema protetor do idoso, inclusive com a uniformização das ações das serventias extrajudiciais;

CONSIDERANDO o previsto no art. 230 da Constituição Federal, bem como o teor normativo do microssistema de proteção do idoso, estabelecido pela Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, que enumera extenso rol de direitos fundamentais, sem olvidar das medidas de proteção;

CONSIDERANDO que a Lei 10.741/2003 prevê a criminalização de uma série de condutas ofensivas ao idoso, inclusive a de lavrar ato notarial que envolva pessoa idosa sem discernimento de seus atos, sem a devida representação legal;

CONSIDERANDO que compete ao Ministério Público promover a revogação de instrumento procuratório do idoso, quando necessário ou o interesse público justificar, segundo determina o art.74, incisos IV, V alíneas “a” a “c”, e VII, do Estatuto do Idoso;

CONSIDERANDO as prioridades na ordem de atendimento previstas no art.3º, inciso I, da Lei 10.741/2003 e no art. 28, inciso II do Código de Normas e Procedimentos dos Serviços Notariais e de Registros do Estado do Piauí;

RESOLVE: Art. 1º - Os Tabeliães do Estado do Piauí, na lavratura de atos notariais que envolva pessoas idosas, assim entendidas aquelas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, deverão

proceder observando as seguintes cautelas:

I – As procurações devem ser confeccionadas com prazo de validade de 06 (seis) meses, renovável de acordo com a necessidade e a vontade do idoso;

II – As procurações devem especificar exatamente o objeto e a finalidade, sendo vedada a utilização da cláusula de irrevogabilidade, a não ser nos casos em que esta cláusula seja da natureza do ato jurídico ou tiver sido estipulada no exclusivo interesse do outorgante.

III – Deve ser facilitada a revogação de procurações, por pessoa idosa, através de simples petição escrita ou oral reduzida a termo;

IV – Em todo caso, devem ser prestadas ao idoso informações adequadas a respeito das consequências advindas do ato ou negócio jurídico a ser celebrado e observadas as normas dispostas na

Lei nº 10.741/2003.

Art. 2º Em caso de dúvida sobre a capacidade civil da pessoa idosa, o Tabelião deve entrevistá-lo, na presença de duas testemunhas instrumentárias, reduzindo a termo as informações colhidas.

Parágrafo único. Persistindo a dúvida ou havendo qualquer suspeita de violação ou ameaça aos direitos do idoso, o Tabelião, expondo, de modo sucinto, os motivos da suspeita, encaminhará o caso, acompanhado do termo das informações colhidas e das provas produzidas, ao Juiz Corregedor Permanente, com cópias dos atos ao Ministério Público, para providências que entender cabíveis.

Art. 3º Inexistindo dúvida quanto à lucidez e à capacidade civil da pessoa idosa, ou sanada a dúvida inicial referida no art. 2º deste Provimento, o Tabelião lavrará o ato jurídico, de acordo com a necessidade e a vontade da pessoa idosa, observadas as cautelas

acima enumeradas e as disposições da Lei nº 10.741/2003.

Art. 4º Assegurar atendimento prioritário às pessoas com idade igual ou superior a sessenta anos, mediante garantia de lugar privilegiado em filas, de senhas com numeração adequada de atendimento preferencial, alocação de espaço para atendimento exclusivo no balcão ou implantação de outro serviço de atendimento personalizado.

Art. 5º Este provimento entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Dê-se ciência, Publique-se e Cumpra-se.

GABINETE DO CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ, em Teresina (PI), 24(vinte e quatro) de setembro de 2013.Francisco

Antônio Paes Landim Filho-Corregedor Geral de Justiça.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

O QUE SÃO PERTENÇAS E COMO IDENTIFICÁ-LAS.


Nos termos do art. 93 do Código Civil, “são pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro.”

Os bens imóveis podem ter pertenças, e no âmbito contratual é muito importante que observemos a existência de pertença a fim de contemplá-la em alguma disposição negocial específica.

Entendemos que, mais que enumerarmos uma série bens que podem assumir a posição de pertença, é importante alertar o leitor ao procedimento que deve utilizar para julgar se determinado bem é uma pertença de outro bem.

Neste aspecto, nos chama a atenção o elucidativo Enunciado da VI Jornada de Direito Civil, que abaixo transcrevemos. Nele fica claro que a avaliação deve ser objetiva e não subjetiva. Logo, não interessa a vontade do dono do bem para determinar se este é pertença. Interessa, sim, perceber se o bem se destina, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro bem, que podemos chamar de principal.

VI Jornada de Direito Civil
ENUNCIADO 535 – Para a existência da pertença, o art. 93 do Código Civil não exige elemento subjetivo como requisito para o ato de destinação.
Artigo: 93 do Código Civil
Justificativa: Parte da doutrina pátria tem sustentado que, para a qualificação de determinada coisa como pertença, é necessária a existência de requisito subjetivo. O requisito subjetivo existiria assentado em ato de vontade do titular da coisa principal ao destinar determinada coisa para atender a finalidade econômico-social de outra. Esse ato, chamado de ato de afetação, é classificado ou como ato jurídico stricto sensu, segundo alguns, ou como negócio jurídico. Entretanto, não se pode pensar o instituto das pertenças com os olhos voltados ao instituto dos imóveis por destinação, na forma como foi regrado no inc. III do art. 43 do Código Civil ab-rogado, em que era exigido do proprietário de coisa móvel o elemento intencional para que fosse concretizado o referido suporte fático. O legislador pátrio não impôs, ao tratar da pertença nos arts. 93 e art. 94 do Código Civil, o elemento volitivo como requisito para configurar a destinação de certa coisa para atender a função econômico-social de coisa principal ou ser a destinação efetuada pelo proprietário. Pela concreção dos elementos do suporte fático do art. 93 do Código Civil, a relação de pertinência é tutelada de modo objetivo. Dessarte, sendo irrelevante a vontade de quem pratica o ato da destinação, importando tão somente o fato de submeter determinada coisa, de modo duradouro, ao fim econômico-social de outra, a destinação tem de ser classificada como ato-fato jurídico. Bastará à realização dessa destinação ter o destinador o poder fático de dispor da coisa principal e da coisa a ser pertença. Não é preciso que seja dono da coisa principal ou da coisa a ser pertença nem que as possua.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

IMPENHORABILIDADE DE IMÓVEL RURAL – SEGUNDO A LEI, SEGUNDO A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E SEGUNDO O STJ.


Um tema muito importante foi abordado no informativo nº 520 Superior Tribunal de Justiça: a impenhorabilidade de bem de família rural. Vejamos a íntegra da notícia:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LIMITES À IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA NO CASO DE IMÓVEL RURAL.

Tratando-se de bem de família que se constitua em imóvel rural, é possível que se determine a penhora da fração que exceda o necessário à moradia do devedor e de sua família. É certo que a Lei 8.009/1990 assegura a impenhorabilidade do imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar. Entretanto, de acordo com o § 2º do art. 4º dessa lei, quando “a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis”. Assim, deve-se considerar como legítima a penhora incidente sobre a parte do imóvel que exceda o necessário à sua utilização como moradia. REsp 1.237.176-SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 4/4/2013.

Quando lemos a notícia fica parecendo que, no caso de imóvel rural, a Lei só nos leva a uma conclusão possível: a penhora de toda a extensão territorial que excede o necessário para sua utilização como moradia. Tomamos a liberdade para, sem emitir juízo acerca do acerto, ou não, da decisão, chamar atenção do leitor para a íntegra do § 2º do art. 4º da Lei nº 8.009/90:

Art. 4 º

(...)

§ 2º Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.

Talvez, à lide não coubesse aplicar a parte final do parágrafo, que resguarda como impenhorável a “área limitada como pequena propriedade rural”. Porém, cabe-nos alertar aos diletos leitores acerca da excepcionalidade das propriedades rurais qualificadas como pequenas.

Da Constituição Federal emana a garantia fundamental protegida pela disposição legal supracitada, vejamos:

Art. 5º

(...)

XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;

Observem que a impenhorabilidade da pequena propriedade rural existe somente quando se trata de ”débitos decorrentes de sua atividade produtiva”, se os débitos decorrem de outra razão, a impenhorabilidade resguardará somente a moradia do devedor, seja pequena, média ou grande propriedade. Tudo isso são conclusões muito óbvias mas que, como não estavam explícitas na notícia do informativo, incumbi-nos fazer o alerta.      

Para ilustrar, aplicando a proteção à pequena propriedade, trazemos precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL TRABALHADA PELA FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE.

1.- Conforme orientação pacífica desta Corte, é impenhorável o imóvel que se enquadra como pequena propriedade rural, indispensável à sobrevivência do agricultor e de sua família (artigo 4º, § 2º, Lei n.º 8.009/90).

2.- Agravo Regimental improvido.

(AgRg no REsp 1357278/AL, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/04/2013, DJe 07/05/2013)

  

PROCESSO CIVIL - EXECUÇÃO FISCAL - BEM DE FAMÍLIA DADO EM GARANTIA - IMÓVEL RURAL - ART. 4º, § 2º, DA LEI 8.009/90 - POSSIBILIDADE NA PARTE QUE EXCEDE AO NECESSÁRIO À MORADIA DO DEVEDOR E DE SUA FAMÍLIA.

1. Inexiste violação ao art. 535 do CPC se o Tribunal aborda todas as questões relevantes para o julgamento da lide.

2. Aplica-se à penhora de imóvel rural o § 2º do art. 4º que dispõe: "quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.

3. Recurso especial parcialmente provido para determinar a penhora do imóvel rural no percentual que exceda o necessário à moradia do devedor.

(REsp 1237176/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/04/2013, DJe 10/04/2013)

 
Observem que no primeiro precedente (AgRg no REsp 1357278/AL) o STJ afirma a posição pacífica deste Egrégio Tribunal firma-se no sentido de concluir que “é impenhorável o imóvel que se enquadra como pequena propriedade rural, indispensável à sobrevivência do agricultor e de sua família”; não há nenhum condicionamento quanto ao tipo de débito para que se considere impenhorável a pequena propriedade rural, esta é a posição pacífica do STJ. Louvável a interpretação que o STJ faz da lei nº 8.009/90, que, inclusive, justifica-se no ordenamento jurídico pátrio.
 
 

quinta-feira, 30 de maio de 2013

CONTRATO DE CORRETAGEM - A COMISSÃO É DEVIDA QUANDO, NA COMPRA E VENDA DE IMÓVEL, HÁ DESISTÊNCIA DO COMPRADOR APÓS ASSINATURA DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PAGAMENTO DE SINAL.


Quando falamos em comissão ao corretor de imóveis em compra e venda, é natural que o senso comum indique que, se o negócio não se efetivou, não há que se falar em pagamento de comissão ao corretor.

Porém, o Código Civil de 2002 trouxe uma nova perspectiva aos contratos de corretagem que, em especial, enseja três situações novas, previstas nos seguintes artigos:

Art. 725. A remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes.

Art. 726. Iniciado e concluído o negócio diretamente entre as partes, nenhuma remuneração será devida ao corretor; mas se, por escrito, for ajustada a corretagem com exclusividade, terá o corretor direito à remuneração integral, ainda que realizado o negócio sem a sua mediação, salvo se comprovada sua inércia ou ociosidade.

Art. 727. Se, por não haver prazo determinado, o dono do negócio dispensar o corretor, e o negócio se realizar posteriormente, como fruto da sua mediação, a corretagem lhe será devida; igual solução se adotará se o negócio se realizar após a decorrência do prazo contratual, mas por efeito dos trabalhos do corretor.

 

O conceito de contrato de corretagem está previsto no artigo 772 do Código Civil:

Art. 722. Pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.

Trazemos, hoje, um precedente que irá interessar em muito aos nossos colegas que trabalham com a compra e venda de imóveis. Nesse precedente fica clara a virada de jurisprudência no STJ após o Código Civil de 2002, e diz respeito, particularmente à aplicação/interpretação do artigo 725 do Código Civil, apreciem a leitura:

 

CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CORRETAGEM. COMISSÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DESISTÊNCIA DO COMPRADOR APÓS ASSINATURA DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PAGAMENTO DE SINAL. COMISSÃO DEVIDA.
1. Discute-se se é devida a comissão de corretagem quando, após a assinatura da promessa de compra e venda e o pagamento de sinal, o negócio não se concretiza em razão do inadimplemento do comprador.
2. No regime anterior ao do CC/02, a jurisprudência do STJ se consolidou em reputar de resultado a obrigação assumida pelos corretores, de modo que a não concretização do negócio jurídico iniciado com sua participação não lhe dá direito a remuneração.
3. Após o CC/02, a disposição contida em seu art. 725, segunda parte, dá novos contornos à discussão, visto que, nas hipóteses de arrependimento das partes, a comissão por corretagem permanece devida.
4. Pelo novo regime, deve-se refletir sobre o que pode ser considerado resultado útil, a partir do trabalho de mediação do corretor.
5. A assinatura da promessa de compra e venda e o pagamento do sinal demonstram que o resultado útil foi alcançado e, por conseguinte, apesar de ter o comprador desistido do negócio posteriormente, é devida a comissão por corretagem.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1339642/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/03/2013, DJe 18/03/2013)

 

Uma pergunta inquietou-nos depois dessa leitura: A comissão é devida no mesmo valor que seria devida se o negócio tivesse obtido êxito?

Isso fica como assunto para um novo encontro!!

domingo, 12 de maio de 2013

A POSSIBILIDADE QUE TEM O TABELIÃO DE NEGAR-SE A LAVRAR ESCRITURA PÚBLICA DE NEGÓCIO JURÍDICO EIVADO DE NULIDADE OU ANULABILIDADE E O DEVER DE ORIENTAR AS PARTES.


Ao elaborar uma escritura pública o Tabelião contempla um negócio jurídico de duas ou mais pessoas que desejam conferir um grau de formalidade ao negócio seja porque a lei exige, seja porque as partes assim o querem.

O Tabelião tem independência para, a partir de seus conhecimentos jurídicos, avaliar se é possível, sob o ponto de vista da legalidade e moralidade, lavrar uma determinada escritura pública.

Cumpre-nos na presente exposição debater a posição do Tabelião frente ao pedido de lavratura de escritura pública de negócio jurídico nulo ou anulável e em caso de assimetria entre as partes.

Quando é procurado para lavrar uma escritura pública, o Tabelião tem toda a liberdade para avaliar se aquele negócio jurídico atende aos requisitos jurídicos que as leis lhes impõem. É exatamente por isso que, diante do caso concreto, o Tabelião pode não lavrar uma escritura pública por reconhecer que há um vício que inquina a relação jurídica de nulidade absoluta.

É vedada a lavratura de escritura pública de negócio jurídico que implique em uma das previsões dos incisos do artigo 166 do Código Civil, a saber: “I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.” Ou ainda o negócio jurídico simulado, imputado como nulo pelo artigo 167 do Código Civil.

Há um debate jurídico sobre a possibilidade jurídica de lavrar escritura pública relativa a negócio jurídico eivado por uma das causas de anulação do negócio jurídico, principalmente tendo em vista a previsão do artigo 172 do Código Civil segundo o qual “negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro”.

Particularmente, entendemos que o negócio jurídico anulável não deve ser conteúdo de uma escritura pública, pois, embora as partes possam confirmá-lo, há uma implicação social perante terceiros, seja qual for o negócio jurídico. E é exatamente para resguardar que terceiros sejam prejudicados por negócios anuláveis que o Tabelião não deve elaborar uma escritura pública cujo conteúdo seja um negócio jurídico anulável.

Trazer para o âmbito de uma escritura pública lavrada por um Tabelião investido de fé pública reveste o ato de uma aparência de seriedade e correção perante a sociedade como um todo. Desta forma, permitir que negócios jurídicos anuláveis sejam lavrados em escritura pública prejudica a confiança que a sociedade deposita nos atos das Serventias extrajudiciais, porque a sociedade pressupõe e o sistema jurídico requer que haja uma criteriosa qualificação do negócio jurídico antes que o mesmo revista-se com a solene forma de escritura pública.

Ao ler uma escritura pública o ordenamento jurídico espera que o cidadão comum confie em seu conteúdo e não se entremeie com a desconfiança de que aquele ato pode ser anulável, dado que o Tabelião não afasta do negócio as causas de anulabilidade. A escritura pública deve consagrar um negócio jurídico eficaz e seguro.

Porém, é necessário entender também que o Tabelião nem sempre vai ter condições ou capacidade de enxergar que o negócio jurídico é anulável. As causas de anulabilidade tem em si uma carga subjetiva, que dificulta que o Tabelião perceba-as sempre, mas as percebendo, acreditamos que não deve lavrar a escritura pública. Por exemplo, percebendo que determinado negócio jurídico implica em abuso de poder, demonstração de hipossuficiência de uma das partes, assimetria nas relações, situações que muitas vezes se enquadram como erro, ignorância, dolo, coação, estado de perigo ou lesão, que vêm a ser causas de anulabilidade, deve negar-se a lavrar a escritura pública.

Nas palavras de Loureiro (2012, p. 528), o Tabelião tem “o dever de aconselhar, de emprestar seu conhecimento jurídico para tornar efetiva e válida a finalidade visada pelos contratantes”. Entretanto, não pode agir como advogado de uma das partes. Se uma das partes está em posição de assimetria em relação a outra, o Tabelião não deve defender a parte que está em desvantagem, mas deve esclarecer e orientar em que implica o negócio jurídico que está sendo firmado.

Há três princípios que devem nortear a atuação do Tabelião diante de um negócio jurídico nulo ou anulável o Princípio da Legalidade ou do controle da legalidade, Princípio da Justiça preventiva e Princípio da Segurança jurídica devem orientar a conduta do Tabelião. Ou seja, a situação pretensamente objeto da escritura pública deve ser submetida ao crivo de qualificação legal/jurídica de forma rigorosa e séria, tudo a fim de assegurar que a escritura lavrada será capaz de entregar às partes uma segurança jurídica apta a evitar lides judiciais acerca do negócio jurídico objeto da escritura pública.

O Tabelião em seu múnus deve considerar a efetivação de uma paz social. E paz social só existe quando as lides são afastadas por um negócio jurídico eficaz, claro e que atende aos anseios de ambas as partes.

Nos termos do artigo 1º da Lei nº 8.935/94, “Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.”

Quando o Tabelião pauta sua atuação nos princípios notariais, qualquer qualificação negativa será fundamentada e bem assimilada pelas partes. Logo, não há problemas em negar-se a lavrar determinada escritura cujo objeto seja nulo, anulável ou mesmo em que a relação jurídica entre as partes fere o ordenamento jurídico. Na verdade, problemas haveria se o Tabelião fizesse sempre tudo o que as partes desejam, não estaria agindo com independência nem contribuindo com a segurança jurídica que o ordenamento espera que seja fruto de seus atos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro. (Lei dos cartórios). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8935.htm> Acesso em 16 fev. 2013. 

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm> Acesso em 16 fev. 2013.
 
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: Teoria e prática. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2012. 716 p.

domingo, 5 de maio de 2013

BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA IMPLICA GRATUIDADE DOS ATOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DOS QUAIS DEPENDE O CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. ENTENDIMENTO DO STJ.


A gratuidade dos atos praticados por notários e registradores é sempre causa de dissenso entre os estudiosos, alguns entendem que a gratuidade só pode ocorrer por força de previsão constitucional ou legal.

Porém, recentemente, temos observado que os juízes têm determinado a gratuidade de certos atos notariais ou registrais, quando a parte é beneficiária da justiça gratuita. Muitas são as vozes que se levantam e dizem que, se não há lei que estenda a gratuidade da justiça aos atos notariais e registrais que decorrem da sentença, não é possível que o juiz imponha a realização de um ato gratuito, sem que haja expressa previsão em lei.

Bem, estender a gratuidade de justiça há um ato notarial ou registral cuja realização está prevista no dispositivo da sentença é uma interpretação razoável sob o ponto de vista da plena execução da sentença. Basta ponderarmos que se a parte não tinha condições financeira de arcar com as custas iniciais também não terá como arcar com os emolumentos dos atos notariais ou registrais e a sentença não alcançará seu escopo.

Porém, não nos parece justo onerar notários e registradores, nós interpretaríamos a gratuidade da justiça impondo ou à parte sucumbente ou ao Estado arcar com os emolumentos da prática do ato notarial ou registral determinado no dispositivo da sentença. 

Segue abaixo, na íntegra, o acórdão do julgamento do AgRg no RMS 24.557-MT, que foi destaque no informativo nº 517 do Superior Tribunal de Justiça, publicado em 02/05/2013, que noticia que “a gratuidade de justiça obsta a cobrança de emolumentos pelos atos de notários e registradores indispensáveis ao cumprimento de decisão proferida no processo judicial em que fora concedido o referido benefício.” O acórdão, como já dissemos, foi proferido em sede de Agravo Regimental em Recurso em Mandado de Segurança, a recorrente foi a ANOREG-MT.
 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA CONCEDIDA JUDICIALMENTE. EXTENSÃO AOS SERVIÇOS REGISTRAIS E NOTARIAIS RESPECTIVOS, NECESSÁRIOS AO PLENO CUMPRIMENTO DO JULGADO. EXECUTIVIDADE E EFETIVIDADE DA DECISÃO JUDICIAL. PRECEDENTES.

1. A gratuidade de justiça concedida em processo judicial deve ser estendida, para efeito de viabilizar o cumprimento de decisão do Poder Judiciário e garantir a prestação jurisdicional plena, aos atos extrajudiciais de notários e de registradores respectivos, indispensáveis à materialização do julgado. Essa orientação é a que melhor se ajusta ao conjunto de princípios e normas constitucionais voltados a garantir ao cidadão a possibilidade de requerer aos poderes públicos, além do reconhecimento, a indispensável efetividade dos seus direitos (art. 5º, XXXIV, XXXV, LXXIV, LXXVI e LXXVII, da CF/88), cabendo ressaltar que a abstrata declaração judicial do direito nada valerá sem a viabilidade da sua execução, do seu cumprimento.
2. A execução do julgado, inegavelmente, constitui apenas uma fase do processo judicial, nela permanecendo intacta a gratuidade de justiça e abrangendo todos os serviços públicos pertinentes à consumação do direito judicialmente declarado.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no RMS 24.557/MT, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2013, DJe 15/02/2013)