Trazemos hoje, um precedente do STJ,
publicado em 23/04/2013, que vai interessar aos nossos leitores que trabalham
em imobiliárias que alugam imóveis.
Primeiro, gostaríamos
que lessem o precedente, em seguida faremos nosso comentário.
PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. LOCAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD
CAUSAM DA ADMINISTRADORA DE IMÓVEIS. INOCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. FALHA NA
PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. APROVAÇÃO CADASTRAL DE LOCATÁRIO SEM CAPACIDADE
ECONÔMICA. DÉBITOS RELATIVOS A ALUGUERES, COTAS CONDOMINIAIS E TRIBUTOS.
OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. ART. 667 C/C 186 DO CC.
1. A administradora de
imóveis figura como mandatária do proprietário do bem para, em nome
deste, realizar e administrar a locação, nos termos do art. 653, do Código
Civil, obrigando-se a indenizar o mandante por quaisquer prejuízos advindos de
sua conduta culposa
(art. 667 do mesmo diploma legal). Por outro lado, não cabe à imobiliária que agiu diligentemente a
responsabilidade pelo pagamento de aluguéis, cotas condominiais ou tributos
inadimplidos pelo locatário - ressalvadas as hipóteses de previsão contratual
nesse sentido -, porquanto ausente sua culpa, elemento imprescindível em sede
de responsabilidade civil subjetiva.
2. Ao revés, configura-se
a responsabilidade da administradora de imóveis pelos prejuízos sofridos
pelo locador quando ela não
cumpre com os deveres oriundos da relação contratual.
3. A recorrente é parte legítima para figurar no polo passivo da
presente demanda, uma vez que a pretensão veiculada na petição inicial não diz
respeito à mera cobrança de alugueres atrasados, mas à responsabilização civil
da imobiliária pelo descumprimento do contrato. No caso concreto, o Tribunal a
quo consignou a efetiva
existência de falha na aprovação do cadastro do locatário e do fiador, uma vez
que a renda auferida por eles não alcançava o patamar mínimo exigido
contratualmente, resultando na frustração da execução que visava à cobrança dos
alugueres e débitos relativos às cotas condominiais e tributos inadimplidos.
4. A pretensão do proprietário do imóvel nasceu com a ciência do defeito na prestação do serviço
consubstanciado na desídia relacionada à aprovação cadastral do locatário e do
fiador, o que se deu por ocasião da frustração do processo executivo
ajuizado em junho de 2003. Tendo a presente demanda sido proposta em agosto de
2005, antes de transcorrido o prazo
trienal previsto no art. 206, § 3º, V, do CC, ressoa manifesta a não ocorrência
da prescrição.
5. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1103658/RN, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
04/04/2013, DJe 23/04/2013)
Bem, muitos podem estar se perguntando
por qual motivo o STJ aplicou o Código Civil e não a Lei nº 8.245/91 (Lei de
Locação). O fato é que o Tribunal está julgando a relação entre a administradora
de imóvel e a pessoa que entrega um imóvel para que ela (imobiliária) alugue.
O STJ entende que está relação é
configurada como um contrato de mandato, artigos 653 a 691 do Código Civil. O
fato nos chama atenção pela não aplicação do Código de Defesa do Consumidor, no
que pensamos que o Superior Tribunal acertou em larga medida.
Quanto a responsabilidade da
administradora de imóveis, na leitura do STJ, aplica-se o artigo 667 do Código
Civil, segundo o qual “O mandatário é obrigado a
aplicar toda sua diligência habitual na execução do mandato, e a indenizar
qualquer prejuízo causado por culpa sua ou daquele a quem substabelecer, sem
autorização, poderes que devia exercer pessoalmente.”
Ou seja, ao escolher o
futuro locatário a imobiliária deve agir com diligência é isso que o dono de
imóvel espera, e a isso que ele tem direito. E o que é diligência habitual no
caso concreto? Diligência é escolher o locatário utilizando critérios objetivos
que apontem que o locatário ostenta um perfil de adimplência. Por exemplo:
locatário e fiadores com ausência de negativação do nome em cadastros como
SERASA e SPC, que possuam renda que supere o valor do aluguel, além disso
fiadores com imóvel registrado em seu nome.
Observando uma eleição objetivamente
criteriosa do locatário, não há como responsabilizar a Imobiliária por falta de
diligência.
Tivemos a curiosidade de
procurar o Relatório do processo que ensejou o acórdão acima, e na nossa opinião
parece-nos que o STJ acertou no julgamento. Pinçamos alguns trechos da
descrição:
De
acordo com o “CONTRATO DE LOCAÇÃO RESIDENCIAL N. 1839/1436” trazido
aos autos pelo próprio apelante (fls. 144/146), verifica-se que sobre o imóvel
locado incidiu um aluguel mensal no valor de R$ 850,00 (oitocentos e cinquenta
reais) a serem pagos na sede da empresa administradora (ora recorrente),
situação que confirma a relação entre as partes, até porque a administradora
apelante sequer questionou que era reembolsada no valor correspondente a 10%
(dez por cento) do valor do aluguel pelos serviços prestados.
22.
Por outro lado, os documentos referidos pelo recorrente nas razões do apelo
demonstram que o locatário percebia um renda mensal líquida no valor de R$
2.369,92 (dois mil trezentos e sessenta e nove reais e noventa e dois centavos),
ou seja, uma renda inferior a três vezes o valor da locação.
23.
Em face de tal situação, verifica-se que o contrato firmado não atentou as regras
seguidas pela administradora recorrente, na medida em que, conforme informou o
seu preposto Pedro Câmara da Costa às fls. 186/187, “o locatário deve ter renda
mensal superior ao triplo de valor do aluguel” (fl.187).
24.
Por sua vez, ao ser ouvido em juízo, o declarante Ricardo Cabral Abreu informou
que “no caso em apreço o locatário possuía fazenda e na oportunidade falou que
havia um renda informal proveniente da exploração de minérios”, tendo em
seguida informado que “tem proprietários que participam de negociação, outros
não; não sabe informar como ocorreu nos autos”, que “não conhece o locatário,
conhecendo o fiador, em virtude do mesmo ser dono de uma empresa conhecida
nesta cidade, porém não tem uma relação de amizade” e que “não se recorda se
chegou a dizer ao autor se a locação teria sido feita por amizade”. (fl. 220).
25.
No entender desta relatoria, tais declarações somente ratificam a conclusão da
má prestação do serviço prestado pela recorrente.
26.
Tal conclusão se deve ao fato de que o próprio declarante reconheceu a necessidade
de uma suplementação de renda para que fosse demonstrada capacidade para
adimplir a obrigação decorrente da locação, aceitando as simples alegações do
locatário sem exigir qualquer documento que desse embasamento àquelas,
assumindo, deste modo, os riscos decorrentes de seu comportamento, ainda mais
quando não restou demonstrado nos autos que tal situação teria sido comunicada
ao locador (ora recorrido).
27.
Estranhamente, o mesmo também diz que não sabia informar como se deu
procedimento para formalização da locação e que não conhecia o locatário, em
que pese, repito, ter aceito as declarações apresentadas pelo locatário,
ressaltando, inclusive, que “no caso em apreço o locatário possuía fazenda”
(fl. 220).
28. Assim,
resta evidente que a empresa recorrente não exigiu do locatário ou do fiador a
demonstração efetiva da capacidade econômica para que fosse firmado o contrato
de locação e também omitiu tal situação do locador, situação que enseja de
forma clara a responsabilidade daquela pelos danos sofridos pelo locador em
razão da ausência da capacidade econômica do locatário e do fiador indicados
pelo recorrente.
Ademais,
a título de reforço de argumento, extrai-se da sentença que "a aprovação
dos cadastros do locatário e do seu fiador teria ocorrido em virtude da amizade
do diretor da empresa com os mesmos" (fl. 287).