quinta-feira, 30 de maio de 2013

CONTRATO DE CORRETAGEM - A COMISSÃO É DEVIDA QUANDO, NA COMPRA E VENDA DE IMÓVEL, HÁ DESISTÊNCIA DO COMPRADOR APÓS ASSINATURA DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PAGAMENTO DE SINAL.


Quando falamos em comissão ao corretor de imóveis em compra e venda, é natural que o senso comum indique que, se o negócio não se efetivou, não há que se falar em pagamento de comissão ao corretor.

Porém, o Código Civil de 2002 trouxe uma nova perspectiva aos contratos de corretagem que, em especial, enseja três situações novas, previstas nos seguintes artigos:

Art. 725. A remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes.

Art. 726. Iniciado e concluído o negócio diretamente entre as partes, nenhuma remuneração será devida ao corretor; mas se, por escrito, for ajustada a corretagem com exclusividade, terá o corretor direito à remuneração integral, ainda que realizado o negócio sem a sua mediação, salvo se comprovada sua inércia ou ociosidade.

Art. 727. Se, por não haver prazo determinado, o dono do negócio dispensar o corretor, e o negócio se realizar posteriormente, como fruto da sua mediação, a corretagem lhe será devida; igual solução se adotará se o negócio se realizar após a decorrência do prazo contratual, mas por efeito dos trabalhos do corretor.

 

O conceito de contrato de corretagem está previsto no artigo 772 do Código Civil:

Art. 722. Pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.

Trazemos, hoje, um precedente que irá interessar em muito aos nossos colegas que trabalham com a compra e venda de imóveis. Nesse precedente fica clara a virada de jurisprudência no STJ após o Código Civil de 2002, e diz respeito, particularmente à aplicação/interpretação do artigo 725 do Código Civil, apreciem a leitura:

 

CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CORRETAGEM. COMISSÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DESISTÊNCIA DO COMPRADOR APÓS ASSINATURA DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PAGAMENTO DE SINAL. COMISSÃO DEVIDA.
1. Discute-se se é devida a comissão de corretagem quando, após a assinatura da promessa de compra e venda e o pagamento de sinal, o negócio não se concretiza em razão do inadimplemento do comprador.
2. No regime anterior ao do CC/02, a jurisprudência do STJ se consolidou em reputar de resultado a obrigação assumida pelos corretores, de modo que a não concretização do negócio jurídico iniciado com sua participação não lhe dá direito a remuneração.
3. Após o CC/02, a disposição contida em seu art. 725, segunda parte, dá novos contornos à discussão, visto que, nas hipóteses de arrependimento das partes, a comissão por corretagem permanece devida.
4. Pelo novo regime, deve-se refletir sobre o que pode ser considerado resultado útil, a partir do trabalho de mediação do corretor.
5. A assinatura da promessa de compra e venda e o pagamento do sinal demonstram que o resultado útil foi alcançado e, por conseguinte, apesar de ter o comprador desistido do negócio posteriormente, é devida a comissão por corretagem.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1339642/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/03/2013, DJe 18/03/2013)

 

Uma pergunta inquietou-nos depois dessa leitura: A comissão é devida no mesmo valor que seria devida se o negócio tivesse obtido êxito?

Isso fica como assunto para um novo encontro!!

domingo, 12 de maio de 2013

A POSSIBILIDADE QUE TEM O TABELIÃO DE NEGAR-SE A LAVRAR ESCRITURA PÚBLICA DE NEGÓCIO JURÍDICO EIVADO DE NULIDADE OU ANULABILIDADE E O DEVER DE ORIENTAR AS PARTES.


Ao elaborar uma escritura pública o Tabelião contempla um negócio jurídico de duas ou mais pessoas que desejam conferir um grau de formalidade ao negócio seja porque a lei exige, seja porque as partes assim o querem.

O Tabelião tem independência para, a partir de seus conhecimentos jurídicos, avaliar se é possível, sob o ponto de vista da legalidade e moralidade, lavrar uma determinada escritura pública.

Cumpre-nos na presente exposição debater a posição do Tabelião frente ao pedido de lavratura de escritura pública de negócio jurídico nulo ou anulável e em caso de assimetria entre as partes.

Quando é procurado para lavrar uma escritura pública, o Tabelião tem toda a liberdade para avaliar se aquele negócio jurídico atende aos requisitos jurídicos que as leis lhes impõem. É exatamente por isso que, diante do caso concreto, o Tabelião pode não lavrar uma escritura pública por reconhecer que há um vício que inquina a relação jurídica de nulidade absoluta.

É vedada a lavratura de escritura pública de negócio jurídico que implique em uma das previsões dos incisos do artigo 166 do Código Civil, a saber: “I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.” Ou ainda o negócio jurídico simulado, imputado como nulo pelo artigo 167 do Código Civil.

Há um debate jurídico sobre a possibilidade jurídica de lavrar escritura pública relativa a negócio jurídico eivado por uma das causas de anulação do negócio jurídico, principalmente tendo em vista a previsão do artigo 172 do Código Civil segundo o qual “negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro”.

Particularmente, entendemos que o negócio jurídico anulável não deve ser conteúdo de uma escritura pública, pois, embora as partes possam confirmá-lo, há uma implicação social perante terceiros, seja qual for o negócio jurídico. E é exatamente para resguardar que terceiros sejam prejudicados por negócios anuláveis que o Tabelião não deve elaborar uma escritura pública cujo conteúdo seja um negócio jurídico anulável.

Trazer para o âmbito de uma escritura pública lavrada por um Tabelião investido de fé pública reveste o ato de uma aparência de seriedade e correção perante a sociedade como um todo. Desta forma, permitir que negócios jurídicos anuláveis sejam lavrados em escritura pública prejudica a confiança que a sociedade deposita nos atos das Serventias extrajudiciais, porque a sociedade pressupõe e o sistema jurídico requer que haja uma criteriosa qualificação do negócio jurídico antes que o mesmo revista-se com a solene forma de escritura pública.

Ao ler uma escritura pública o ordenamento jurídico espera que o cidadão comum confie em seu conteúdo e não se entremeie com a desconfiança de que aquele ato pode ser anulável, dado que o Tabelião não afasta do negócio as causas de anulabilidade. A escritura pública deve consagrar um negócio jurídico eficaz e seguro.

Porém, é necessário entender também que o Tabelião nem sempre vai ter condições ou capacidade de enxergar que o negócio jurídico é anulável. As causas de anulabilidade tem em si uma carga subjetiva, que dificulta que o Tabelião perceba-as sempre, mas as percebendo, acreditamos que não deve lavrar a escritura pública. Por exemplo, percebendo que determinado negócio jurídico implica em abuso de poder, demonstração de hipossuficiência de uma das partes, assimetria nas relações, situações que muitas vezes se enquadram como erro, ignorância, dolo, coação, estado de perigo ou lesão, que vêm a ser causas de anulabilidade, deve negar-se a lavrar a escritura pública.

Nas palavras de Loureiro (2012, p. 528), o Tabelião tem “o dever de aconselhar, de emprestar seu conhecimento jurídico para tornar efetiva e válida a finalidade visada pelos contratantes”. Entretanto, não pode agir como advogado de uma das partes. Se uma das partes está em posição de assimetria em relação a outra, o Tabelião não deve defender a parte que está em desvantagem, mas deve esclarecer e orientar em que implica o negócio jurídico que está sendo firmado.

Há três princípios que devem nortear a atuação do Tabelião diante de um negócio jurídico nulo ou anulável o Princípio da Legalidade ou do controle da legalidade, Princípio da Justiça preventiva e Princípio da Segurança jurídica devem orientar a conduta do Tabelião. Ou seja, a situação pretensamente objeto da escritura pública deve ser submetida ao crivo de qualificação legal/jurídica de forma rigorosa e séria, tudo a fim de assegurar que a escritura lavrada será capaz de entregar às partes uma segurança jurídica apta a evitar lides judiciais acerca do negócio jurídico objeto da escritura pública.

O Tabelião em seu múnus deve considerar a efetivação de uma paz social. E paz social só existe quando as lides são afastadas por um negócio jurídico eficaz, claro e que atende aos anseios de ambas as partes.

Nos termos do artigo 1º da Lei nº 8.935/94, “Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.”

Quando o Tabelião pauta sua atuação nos princípios notariais, qualquer qualificação negativa será fundamentada e bem assimilada pelas partes. Logo, não há problemas em negar-se a lavrar determinada escritura cujo objeto seja nulo, anulável ou mesmo em que a relação jurídica entre as partes fere o ordenamento jurídico. Na verdade, problemas haveria se o Tabelião fizesse sempre tudo o que as partes desejam, não estaria agindo com independência nem contribuindo com a segurança jurídica que o ordenamento espera que seja fruto de seus atos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro. (Lei dos cartórios). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8935.htm> Acesso em 16 fev. 2013. 

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm> Acesso em 16 fev. 2013.
 
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros Públicos: Teoria e prática. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2012. 716 p.

domingo, 5 de maio de 2013

BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA IMPLICA GRATUIDADE DOS ATOS NOTARIAIS E REGISTRAIS DOS QUAIS DEPENDE O CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. ENTENDIMENTO DO STJ.


A gratuidade dos atos praticados por notários e registradores é sempre causa de dissenso entre os estudiosos, alguns entendem que a gratuidade só pode ocorrer por força de previsão constitucional ou legal.

Porém, recentemente, temos observado que os juízes têm determinado a gratuidade de certos atos notariais ou registrais, quando a parte é beneficiária da justiça gratuita. Muitas são as vozes que se levantam e dizem que, se não há lei que estenda a gratuidade da justiça aos atos notariais e registrais que decorrem da sentença, não é possível que o juiz imponha a realização de um ato gratuito, sem que haja expressa previsão em lei.

Bem, estender a gratuidade de justiça há um ato notarial ou registral cuja realização está prevista no dispositivo da sentença é uma interpretação razoável sob o ponto de vista da plena execução da sentença. Basta ponderarmos que se a parte não tinha condições financeira de arcar com as custas iniciais também não terá como arcar com os emolumentos dos atos notariais ou registrais e a sentença não alcançará seu escopo.

Porém, não nos parece justo onerar notários e registradores, nós interpretaríamos a gratuidade da justiça impondo ou à parte sucumbente ou ao Estado arcar com os emolumentos da prática do ato notarial ou registral determinado no dispositivo da sentença. 

Segue abaixo, na íntegra, o acórdão do julgamento do AgRg no RMS 24.557-MT, que foi destaque no informativo nº 517 do Superior Tribunal de Justiça, publicado em 02/05/2013, que noticia que “a gratuidade de justiça obsta a cobrança de emolumentos pelos atos de notários e registradores indispensáveis ao cumprimento de decisão proferida no processo judicial em que fora concedido o referido benefício.” O acórdão, como já dissemos, foi proferido em sede de Agravo Regimental em Recurso em Mandado de Segurança, a recorrente foi a ANOREG-MT.
 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA CONCEDIDA JUDICIALMENTE. EXTENSÃO AOS SERVIÇOS REGISTRAIS E NOTARIAIS RESPECTIVOS, NECESSÁRIOS AO PLENO CUMPRIMENTO DO JULGADO. EXECUTIVIDADE E EFETIVIDADE DA DECISÃO JUDICIAL. PRECEDENTES.

1. A gratuidade de justiça concedida em processo judicial deve ser estendida, para efeito de viabilizar o cumprimento de decisão do Poder Judiciário e garantir a prestação jurisdicional plena, aos atos extrajudiciais de notários e de registradores respectivos, indispensáveis à materialização do julgado. Essa orientação é a que melhor se ajusta ao conjunto de princípios e normas constitucionais voltados a garantir ao cidadão a possibilidade de requerer aos poderes públicos, além do reconhecimento, a indispensável efetividade dos seus direitos (art. 5º, XXXIV, XXXV, LXXIV, LXXVI e LXXVII, da CF/88), cabendo ressaltar que a abstrata declaração judicial do direito nada valerá sem a viabilidade da sua execução, do seu cumprimento.
2. A execução do julgado, inegavelmente, constitui apenas uma fase do processo judicial, nela permanecendo intacta a gratuidade de justiça e abrangendo todos os serviços públicos pertinentes à consumação do direito judicialmente declarado.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no RMS 24.557/MT, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2013, DJe 15/02/2013)