A Lei dos Juizados Especial prevê a
competência para ações de despejo para uso próprio (art. 3º, III da Lei nº
9.099/95) sem especificar que este uso seja comercial ou residencial.
É sabido que a Lei de Locação (Lei
nº 8.245/91) prevê a modalidade de despejo para uso próprio somente na locação
residencial, vejamos:
Lei nº 8.245/91
CAPÍTULO II
Das
Disposições Especiais
SEÇÃO I
Da locação residencial
(...)
Art. 47. Quando ajustada verbalmente ou por escrito e como prazo
inferior a trinta meses, findo o prazo estabelecido, a locação prorroga -
se automaticamente, por prazo indeterminado, somente podendo ser retomado o
imóvel:
I - Nos
casos do art. 9º;
II -
em decorrência de extinção do contrato de trabalho, se a ocupação do imóvel
pelo locatário relacionada com o seu emprego;
III - se for pedido para uso
próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente
ou descendente que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de
imóvel residencial próprio;
IV -
se for pedido para demolição e edificação licenciada ou para a realização de
obras aprovadas pelo Poder Público, que aumentem a área construída, em, no
mínimo, vinte por cento ou, se o imóvel for destinado a exploração de hotel ou
pensão, em cinqüenta por cento;
V -
se a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos.
Grifos
acrescidos
Quando a Lei nº 9.099/95 não
especifica uma modalidade de uso específico para a retomada no imóvel através de
ação proposta no Juizado, sustentamos que a ação poderia ser proposta em locações
com finalidade residencial ou comercial. Não cabe restringir quando a Lei dos
Juizados Especiais para definir competência não restringiu.
Sabemos que é possível interpretar
que a Lei dos Juizados por ser posterior à Lei de Locações teria utilizados as
bases conceituais já pré-estabelecidas por esta última, mas se percebemos a ausência
de referência explicita podemos também concluir o contrário. Alargar a competência
do conceito de uso próprio, para tanto residencial, quanto comercial, prestigia
a celeridade processual consagrada na Constituição Federal. Os Juizados
Especiais e Turmas Recursais pelo país já decidem como defendemos:
CIVIL. CONTRATUAL. LOCAÇÃO.
LEI Nº 8.245/91. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE DESPEJO PARA USO PRÓPRIO. IMÓVEL COMERCIAL. DENÚNCIA VAZIA CONSULTÓRIO ODONTOLÓGICO PARA USO DE FILHO.
NOTIFICAÇÃO PREMONITÓRIA. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DOS JECS, VALOR DA
CAUSA E DA COMPLEXIDADE DA MATÉRIA E DE COISA JULGADA REJEITADAS. RECURSO
CONHECIDO CONQUANTO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. UNÂNIME. 1. O ART. 3º DA LEI 9.099/95, EM SEU INCISO
III AUTORIZA A UTILIZAÇÃO DOS JECS, PARA O DESPEJO PARA USO PRÓPRIO. FINS
SOCIAIS DA LEI. INTELIGÊNCIA DO ART. 4º DA LICC. 2. ESTANDO O PROCESSO MADURO E
PRONTO PARA RECEBER SENTENÇA, IMPÕE-SE AO JUIZ O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE,
TUDO EM CONSONÂNCIA AO ART. 330, II DO CPC C/C ART. 2º DA LEI DE REGÊNCIA. 3.
NÃO CONFIGURA CERCEAMENTO DE DEFESA, O INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL EM SEDE
DE JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, QUESTÃO UNICAMENTE DE INTERPRETAÇÃO DE NORMA
LEGAL, PREVISTA NA LEI DE LOCAÇÃO, EM VIRTUDE DE MERA ALEGAÇÃO DE QUE EXISTE
OUTRO IMÓVEL DENTRO DO MESMO LOTE E COMO TAL O PLEITO É DESMOTIVADO. 4. NÃO
FERE COISA JULGADA A ALEGAÇÃO DA PROPOSITURA DE OUTRA AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE
ANTERIORMENTE, JÁ QUE NA LOCAÇÃO
COMERCIAL PODE A QUALQUER TEMPO, O LOCADOR PLEITEAR A RETOMADA DO IMÓVEL.
COISA JULGADA FORMAL. 5. REJEITAM-SE TAMBÉM AS PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA
DOS JEC, NO TOCANTE AO VALOR DA CAUSA EM CONTRATO DE LOCAÇÃO, VEZ QUE O QUE SE
BUSCA AQUI É O BEM DE VIDA PRETENDIDO,RESCISÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL
COM RETOMADA PARA USO PRÓPRIO. PRELIMINARES REJEITADAS.UNÂNIME. 6. OCORRENDO A
NOTIFICAÇÃO PREVISTA NA LEI 8.245/91, CONSOANTE O SEU ART. 57 E DECORRIDO O
PRAZO LEGAL DE 30 DIAS PARA DESOCUPAÇÃO AMIGÁVEL DO IMÓVEL, IMPÕE-SE A
PROPOSITURA DA AÇÃO DE RETOMADA PARA USO PRÓPRIO. 7. HÁ PRESUNÇÃO DE NECESSIDADE DO BEM LOCADO PARA USO PRÓPRIO - FILHO
DENTISTA - DECORRENTE DE LEI. 8. EXERCÍCIO DO DIREITO CONSTITUCIONAL DE
PROPRIEDADE NA RETOMADA. BOA-FÉ PRESUMIDA. SINCERIDADE E NECESSIDADE RELATIVAS.
9. DE CONFORMIDADE COM O REGRAMENTO QUE ESTÁ AMALGAMADO NO ARTIGO 55 DA LEI DOS
JUIZADOS ESPECIAIS (LEI Nº 9.099/95), O RECORRENTE, SUCUMBINDO NO SEU
INCONFORMISMO, SUJEITA-SE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E DOS HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS, OS QUAIS FIXO EM 20% (VINTE POR CENTO) SOBRE O VALOR CORRIGIDO DA
CONDENAÇÃO. 10. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO, CONSOANTE REITERADOS JULGADOS
DAS TURMAS RECURSAIS, LEGITIMANDO A LAVRATURA DO ACÓRDÃO NOS MOLDES AUTORIZADOS
PELO ARTIGO 46 DA LEI Nº 9.099/95. UNÂNIME
(TJ-DF - ACJ: 20070610059266
DF, Relator: ALFEU MACHADO, Data de Julgamento: 14/03/2008, Segunda Turma
Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Publicação:
DJU 07/04/2008 Pág. : 148)
Em sentido contrário ao
que advogamos, porém, o Enunciado nº 4 do Fórum Nacional de Juizados Especiais
(FONAJE)
estabelece que “nos Juizados Especiais só se
admite a ação de despejo prevista no art. 47, inciso III, da Lei 8.245/1991”. Ou
seja, somente poderia ser proposta ação de despejo para uso próprio na locação
para fins residenciais.