quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

PRECEDENTE JUDICIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PIAUÍ: DESCONSTITUIÇÃO DE HIPOTECA/ DEMORA/ INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.


Foi publicado no Diário da Justiça do Estado do Piauí nº 7.211 (disponibilização 06/02/2013) um acórdão cuja matéria discutida interessa ao nosso blog.
Para não ficar muito cansativo, visto que o acórdão é longo, deixaremos aqui o precedente para leitura de todos, e na sequência volto com debate sobre a matéria discutida no julgamento.

Peço que tenham atenção especial aos trechos que destacamos.

Segue o acórdão na íntegra:

Tribunal de Justiça do Piauí

3ª Câmara Especializada Cível

Apelação Cível nº 2011.0001.003155-9

Origem: 7ª Vara Cível da Comarca de Teresina

Relator: Desembargador Francisco Paes Landim

Ementa

APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE AD CAUSAM. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. COGNOSCÍVEL DE OFÍCIO PELO JULGADOR. RELAÇÃO DE DIREITO MATERIAL ESTABELECIDA ENTRE A CONSTRUTORA E A ADQUIRENTE DO IMÓVEL. ADEQUAÇÃO ENTRE O SUJEITO E A CAUSA.

A CONSTRUTORA É PARTE LEGÍTIMA PARA LIBERAR O GRAVAME HIPOTECÁRIO QUE RECAIA SOBRE O IMÓVEL. PAGAMENTO DASPARCELAS DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL PELA ADQUIRENTE. DEMORA NA LIBERAÇÃO DO ÔNUS HIPOTECÁRIO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. ATO ILÍCITO QUE DEVE SER REPARADO. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO.

1. A ilegitimidade ad causam é matéria de ordem pública, aferível de ofício, conforme art. 301, § 4º, do CPC, razão pela qual, em relação a essa condição da ação, da mesma forma como sucede quanto às outras, não se opera a preclusão:

Art.301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar:

(...)

X-carência de ação;

(…)

§4º Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste artigo.

2. Desse modo, ainda que não suscitada a matéria pela parte litigante, em preliminar de contestação, pode sê-lo em sede recursal, depois de proferida a sentença, pois o magistrado pode reconhecê-la de ofício, ainda que um segundo grau de jurisdição.

3. Ressalte-se que o conhecimento do tema de ofício não é apenas “enquanto não proferida sentença de mérito” em primeiro grau, pois se estende até o julgamento do recurso ordinário interposto (conforme RSTJ 89/193), isto é, “a sentença de mérito proferida em primeiro grau não impede que o Tribunal conheça dessas matérias (as do art. 267, IV, V e VI) ainda que ventiladas apenas em fase de recurso, ou mesmo de ofício (RSTJ 89/193)” (V. Theotonio Negrão, Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, 1999, art. 267, nota 54a, p. 323).

4. Assim, o fato de a matéria acerca da ilegitimidade passiva da parte só ter sido levantado em segundo grau, não impede sua apreciação, que se impõe de ofício pelo julgador, não ocorrendo, portanto, a preclusão acerca da matéria.

5. A legitimidade ad causam pode ser conceituada “(…) como relação de legítima adequação entre o sujeito e a causa.”, a qual autoriza “que o sujeito figure como parte no processo como um todo, com aptidão para realizar os atos inerentes a ele.

(Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, 2009, pp. 313 e 314, nº 545).

6. Porque a legitimidade ad causam corresponde à “relação de legítima adequação entre o sujeito e a causa.”, Cândido Rangel Dinamarco registra que referida condição da ação é atinente “a determinado conflito trazido ao exame do juiz.” (Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, 2009, p. 313, nº 545).

7. Portanto, é um atributo aferível apenas em concreto, por se tratar de uma condição da ação “transitiva, relacional”, que se encontra “ligada a uma determinada situação” (Leo Rosenberg, Tratado de derecho procesal civil, tomo I, 1955, p. 225, apud Fredie Didier Jr., Pressupostos Processuais e Condições da Ação, 2010, p. 230, nº 8.1).

8. Daí afirmar-se que a legitimidade ad causam aférese diante do objeto litigioso, a relação jurídica substancial [rectius: material] deduzida (…)” (Fredie Didier Jr.,  Pressupostos Processuais e Condições da Ação, 2010, p. 230, nº 8.1). Essa máxima doutrinária leva Araken de Assis à conclusão de que “toda legitimidade baseia-se em regras de direito material” (Substituição processual, em Revista Dialética de Direito Processual, 2003, nº 9, p. 10, apud Fredie Didier Jr., ob. cit., p. 230, nº 8.1).

9. Embora essa associação entre direito material e legitimidade ad causam tenha aplicabilidade restrita ao campo da legitimação ordinária, como adverte Daniel Neves, é certo que, em doutrina, tradicionalmente se afirma que serão legitimados ao processo os sujeitos descritos como titulares da relação jurídica de direito material deduzida pelo demandante” (Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil, 2012, p. 98, nº 3.2.4).

10. Assim, na medida em que o presente processo tem por objeto relação de direito material estabelecida entre a Construtora Apelante e a Apelada, é evidente a legitimidade ad causam passiva daquela, uma vez constatada, na precisa terminologia de Cândido Rangel Dinamarco, “relação de legítima adequação entre o sujeito e a causa” (Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, 2009, p. 313, nº 545).

11. Ainda que a hipoteca tenha sido constituída em favor do Banco Bradesco, segundo Réu, que participou do empreendimento na qualidade de agente financeiro, e a Construtora, primeira Ré e ora Apelante, promitente vendedora do imóvel em litígio, não possa, por si só, desconstituir a hipoteca referente ao imóvel, não há como impor referida obrigação, unicamente, contra o agente financeiro, como pretende a Apelante, tratando-se, pois, de hipótese de litisconsórcio passivo necessário. (Precedente do TJMG)

12. É inegável a legitimidade passiva ad causam da Construtora, na medida em que figura na relação de direito material posta em juízo, e, além disso, é parte legítima para liberar o ônus hipotecário que recaia sobre o imóvel.

13. O STJ, em junho de 2010, editou o Informativo de Jurisprudência nº 0438, segundo o qual, após o pagamento das parcelas do contrato de compra e venda de bem imóvel, pelo adquirente, a demora na liberação do gravame hipotecário, pelo Incorporador, gera a indenização por danos morais.

14. Para o Superior Tribunal de Justiça, a demora na liberação do ônus hipotecário, pelo Incorporador, não se trata de mero descumprimento contratual, como alega a Apelante, mas de ato ilícito que deve ser reparado. (STJ, REsp 966416/RS, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/06/2010, DJe 01/07/2010)

15. Desnecessária a prova de maiores abalos experimentados pela autora, no caso concreto, além dos decorrentes da prestação defeituosa do serviço, que por si só justificam o dever de indenizar, inclusive em danos morais.

16. Na indenização por dano moral, a correção monetária incidirá a partir do julgamento de 1º grau (Súmula 362, do STJ), com os juros de mora contados a partir da citação válida, já que se trata de relação contratual, conforme art. 405 do Código Civil.

17. Apelação Cível conhecida e improvida.

Acórdão

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os componentes da Egrégia 3ª Câmara Especializada Cível, do Tribunal de Justiça do Estado, por votação unânime, em conhecer da Apelação Cível e lhe negar provimento para manter a sentença apelada em todos os seus termos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário