segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

DA NULIDADE DA CLÁUSULA CONTRATUAL QUE CONSTITUIU AS HIPOTECAS, NO CASO EM QUE OS BENS QUE COMPÕEM O ESPÓLIO SÃO HIPOTECADOS SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL.


PARTE 1/3

O tema é deveras importante e longo, por isso o dividiremos em 3 partes. As citações são feitas ao Código Civil de 1916, dado que o estudo nós aplicamos em um caso que ocorreu sob a égide do citado Código.

Hipoteca é um direito real de garantia que recai, dentre outros bens, sobre imóveis, sujeitando-os, preferentemente, ao pagamento de uma dívida.

Hipoteca tem a característica jurídica de ser negócio solene. Neste sentido o artigo 134, inciso II do Código Civil de 1916:

Art. 134. É, outro sim, da substância do ato o instrumento público:

.........................................

II. Nos contratos constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis de valor superior a Cr$50.000,00 (cinqüenta mil cruzeiros), excetuado o penhor agrícola.

 

Para oferecer um bem a hipoteca há um requisito subjetivo de cunho essencial: admite-se que só pode hipotecar aquele que pode alienar, neste sentido o Código Civil de 1916 estabelece:

Art. 756. Só aquele que pode alienar, poderá hipotecar, dar em anticrese, ou empenhar. Só as coisas que se podem alienar poderão ser dadas em penhor, anticrese, ou hipoteca.

Parágrafo único. O domínio superveniente revalida, desde a inscrição, as garantias reais estabelecidas por quem possuía a coisa a título de proprietário.

(grifos acrescidos)  

 

“Para a validade da hipoteca exige a lei, além da capacidade para os atos da vida civil, a especial para alienar” (Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 5. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 573)

A capacidade do agente, neste caso uma capacidade especial, é aspecto que diz respeito à validade do ato jurídico, sob o aspecto de ter sido preterida uma solenidade, qual seja a autorização judicial para constituir hipoteca sobre os bens que compõem a herança.

Estamos diante de uma causa especial de validade do ato jurídico, a capacidade para alienar, que no caso de Inventariante/herdeiro em relação aos bens que compõem o Espólio, só poderia ter ser alcançada através autorização judicial.

Ou seja, o Inventariante, que não pode alienar os bens do Espólio, salvo autorização judicial, também não pode hipotecar os bens que compõem o Espólio, a não ser mediante autorização judicial.

Essa conclusão é crucial: se faltou autorização judicial ao inventariante para hipotecar os bens do Espólio, a cláusula que estabeleceu as hipotecas no contrato, é NULA. Perceba-se que as hipotecas não cumpriram o preceito do artigo 756 do Código Civil de 1916. Ou seja, se o inventariante não podia alienar os bens do Espólio, também não podia hipotecá-los.

Os bens que compõem o Espólio são indivisíveis, nenhum dos herdeiros pode dispor dos bens da herança, nem aliená-los, nem instituir ônus real sobre esses bens, nesse sentido o artigo 1.580 do Código Civil de 1916:

Art. 1.580. Sendo chamadas simultaneamente, a uma herança, várias pessoas, será indivisível o seu direito, quanto a posse e ao domínio, até se ultimar a partilha.

 

No mesmo sentido a interpretação da doutrina pátria:

“O inventariante não pode igualmente constituir hipoteca sobre bens que integram o acervo hereditário, salvo mediante autorização judicial. Todavia, o herdeiro, aberta a sucessão, pode dar em hipoteca sua parte ideal, que deverá ser separada na partilha e atribuída ao arrematante” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 5. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 574)

 

Constituem causas de nulidade nos termos do Código Civil de 1916:

CAPÍTULO V

DAS NULIDADES

Art. 145. É nulo o ato jurídico:

I. Quando praticado por pessoa absolutamente incapaz (art. 5).

II. Quando for ilícito, ou impossível, o seu objeto.

III. Quando não revestir a forma prescrita em lei (arts. 82 e 130).

IV. Quando for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade.

V. Quando a lei taxativamente o declarar nulo ou lhe negar efeito.

Art. 146. As nulidades do artigo antecedente podem ser alegadas por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir.

Parágrafo único. Devem ser pronunciadas pelo juiz, quando conhecer do ato ou dos seus efeitos e as encontrar provadas, não lhe sendo permitido supri-las, ainda a requerimento das partes.

(grifos acrescidos)

 

Uma vez que o Código Civil de 1916, no seu artigo 756, considera essencial para a validade da hipoteca que aquele que oferece bens em hipoteca tenha capacidade de alienar; e no que concerne aos bens deixados por herança, quando há mais de um herdeiro, o direito sobre a herança é indivisível, nos termos do artigo 1.580 do Código Civil de 1916, isto é, não pode ser exercido por um dos herdeiros individualmente. É de rigor que, não tem o Inventariante, ou qualquer dos herdeiros, capacidade para alienar os bens que compõem o Espólio, nem, portanto, para hipotecar, salvo diante de autorização judicial.
A conclusão, portanto, não pode ser outra, se falta a capacidade especial para alienar, falta capacidade para hipotecar; a ausência de autorização judicial para hipotecar fere a validade do ato jurídico, tornando-o NULO, nos termos do artigo 145, inciso IV do Código Civil de 1916.

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